terça-feira, 9 de novembro de 2010

Contencioso:
Administrativo
Data:
21-05-2010
Processo:
06326/10
Nº Processo/TAF:
00640/09.2BEALM
Sub-Secção:
2º. Juízo
Magistrado:
Clara Rodrigues
Descritores:
ACÇÃO ESPECIAL.PENA DISCIPLINAR.AUSÊNCIA DE RECURSO HIERÁRQUICO NECESSÁRIO.ART. 120º RDGNR.INIMPUGNABILIDADE DO ACTO.

Texto Integral:
Venerando Juiz Desembargador RelatorA Magistrada do MºPº junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, vem, nos termos e para efeitos dos artºs 146º nº1 do CPTA, emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, nos seguintes termos:I – O Presente recurso vem interposto, pelo então A., do despacho saneador/sentença a fls. 46 e segs., do TAF de Almada, que absolveu o Réu da instância por ter julgado procedente a excepção da inimpugnabilidade do acto.Nas conclusões das suas alegações de recurso, o recorrente imputa à sentença em recurso violação dos arts. 2º, 3º e 51º nº 1 todos do CPTA.A Entidade ora recorrida não apresentou contra - alegações.II – Na sentença em recurso foram dados como provados os factos constantes das alíneas a) a d), do ponto II.2.1, a fls. 48, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos.III – Em causa está aferir se o recurso hierárquico previsto no art. 120º do Regulamento de Disciplina da GNR, aprovado pelo DL nº 145/99 de 01/09, é um pressuposto processual específico para a impugnação contenciosa dos actos administrativos. O Recorrente defende que nos termos do novo CPTA, um acto com eficácia externa, especialmente se for imediatamente lesivo, como sucede com o em apreço de aplicação de pena disciplinar, é passível de impugnação judicial imediata, nos termos do art. 51º, nº 1 do CPTA.Com efeito, embora haja quem defenda que as normas especiais que prevêem o recurso hierárquico necessário se encontram revogadas face ao novo regime processual administrativo, já segundo Mário Aroso de Almeida e Carlos Esteves Cadilha, em anotação ao art. 51º do CPTA, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que passamos a citar « Nem o diploma preambular, nem o CPTA, tomam porém, posição expressa quanto às múltiplas disposições legais avulsas que prevêem mecanismos de impugnação administrativa necessária (reclamação, recurso hierárquico ou recurso tutelar). Parece dever, assim, entender - se que estas disposições de direito substantivo continuam em vigor, pelo que, nos casos nelas previstos, é necessária a utilização da impugnação administrativa (v.g., o recurso hierárquico de aplicação de quaisquer penas que não sejam de competência exclusiva do membro do Governo – art. 75, nº 8 do ED; o recurso hierárquico de actos de exclusão e da homologação da lista de classificação final no âmbito dos concursos de recrutamento e selecção de pessoal – arts. 43º nºs 1 e 2 do DL nº 204/98 de 11 de Julho).(…) A precedência obrigatória da impugnação administrativa mantém - se em relação aos casos especialmente previstos na lei. Poderá suscitar - se, neste caso a questão da inconstitucionalidade das disposições avulsas que estatuem uma reclamação ou recurso administrativo necessário, por violação da norma do art. 268º nº 4 da CRP. Todavia, quer o TC, quer o STA, têm mantido o entendimento da não inconstitucionalidade de tais normas, alegando que a eliminação do conceito de acto definitivo e executório e a sua substituição no texto do art. 268º nº 4 da CRP, pelo acto lesivo não impede o legislador ordinário de estipular pressupostos processuais específicos para a impugnação contenciosa dos actos administrativos.».Ainda em anotação ao art. 59º nº 5 do CPTA dizem os mesmos AA., na obra citada «O preceito afasta, pois, o requisito da definitividade vertical como pressuposto da impugnabilidade contenciosa ( do mesmo modo que o art. 51º nº 1, havia já afastado a definitividade horizontal ). Mas não põe em causa as normas que, no âmbito de procedimentos administrativos especiais, prevejam expressamente formas de impugnação administrativa necessária – reclamação, recurso hierárquico ou recurso tutelar …» (sublinhado nosso).Como se pode ler no Ac. deste TCAS de 16/03/2005, Rec. 07511/03, relativo a reclamação hierárquica necessária «A reclamação é um meio de impugnação graciosa de um acto administrativo junto do autor deste e tem por conteúdo o pedido de revogação ou de modificação de tal acto cfr. art. 158º., nos 1 e 2, al. a), do C.P.A. Consoante constituam ou não um pressuposto legal do recurso contencioso de certos actos, as reclamações classificam-se como necessárias ou facultativas. No caso em apreço, resulta claramente dos arts. 186º., 187º. e 188º., todos do E.M.G.N.R., que a reclamação precede necessariamente o direito de interpor recurso hierárquico, pelo que o recorrente só poderia interpor recurso hierárquico, para o Ministro da Administração Interna, do acto do Comandante-Geral da G.N.R. que tivesse decidido a reclamação (cfr. Ac. STA de 13/7/95 in BMJ 449º.-140). E esta conclusão impõe-se, quer o acto inicialmente praticado tenha resultado da iniciativa da Administração, quer tenha sido despoletado por um requerimento de um particular, pois nem os preceitos citados nem o C.P. Administrativo distinguem essas situações, não podendo, por isso, o intérprete distingui-las. » (bold nosso).Por sua vez, no Ac. do STA de 04/06/2009, Rec. 0377/08 expende - se o seguinte:« O disposto nos citados n.ºs 4 e 5 do art.º 59, epigrafado de "Início dos prazos de impugnação" (contenciosa), reporta-se, apenas, à utilização de meios de impugnação administrativa facultativos (recursos e reclamações não necessários), porquanto, tratando-se de impugnações necessárias, como é patente, o acto não é ainda passível de impugnação contenciosa não estando nenhum prazo a correr para esse efeito (veja-se o "Código de Processo nos Tribunais Administrativos", I, de Mário Esteves de Oliveira e outro, 391 e o acórdão STA de 22.3.07 no recurso 848/06). (bold nosso).(…)Evidentemente que estão excluídas por via do CPTA (essas acabaram definitivamente) as que não estivessem previstas e que a jurisprudência considerava necessárias apenas para executar a hierarquia e assegurar a definitividade vertical. (previstas na lei) que no regime antecedente eram tidas pelos tribunais, ainda que sem norma expressa, como necessárias. E, no entanto, esta é a verdadeira questão que a entrada em vigor do CPTA suscita.A solução, quanto a elas, terá, todavia, que ser idêntica. Com efeito, este Tribunal foi construindo uma corrente jurisprudencial que assentava fundamentalmente na constatação de que as reclamações que estivessem especialmente previstas eram, salvo determinação expressa da lei em contrário, qualificadas como necessárias, correspondendo a um passo que o interessado teria que dar caso pretendesse agir pela via judicial. Ora, se a jurisprudência do mais alto tribunal da Jurisdição Administrativa, de modo uniforme, primeiro com fundamentação doutrinal, depois com base em preceitos legais, elaborou um critério que lhe permitia distinguir as reclamações (previstas) que eram das que não eram necessárias, e não tendo o CPTA - todos o reconhecem - uma disposição expressa que as elimine é inquestionável que, após o CPTA, para além das expressamente contempladas na lei como necessárias, também o são as que anteriormente cumpriam o critério jurisprudencialmente definido de forma clara e inequívoca. Por outras palavras, se já havia um padrão para as reclamações anteriores ao CPTA dizendo que eram necessárias sempre que previstas, então esse padrão, pelo menos para essas, terá de manter-se, não sendo aceitável qualquer outra solução tendo em consideração os princípios que o enformam. Se o Código continua a admitir impugnações necessárias desde que previstas na lei como tais, têm que se considerar necessárias as que anteriormente eram consideradas como tendo essa natureza - justamente por estarem previstas na lei - apesar de não terem aposta essa menção expressa. Trata-se de situações idênticas que merecem idêntico tratamento. De resto, Esteves de Oliveira e outro, "Código de Processo nos Tribunais Administrativos", I, 347, referem-no, objectivamente, ao escreverem que "Devem, porém, considerar-se em vigor as disposições legais específicas anteriores ao CPTA que de modo claro (que não expresso, dizemos nós) tornavam a impugnação contenciosa dos actos praticados por órgãos subalternos dependente de prévia impugnação hierárquica, como nada obsta também a que o legislador venha a dispor expressamente, no futuro, para esta ou aquela espécie de actos administrativos, sobre a obrigatoriedade de sua impugnação hierárquica prévia".(…)Aquela construção jurisprudencial, erguida ao longo dos tempos, partia de uma constatação objectiva: se a reclamação facultativa sempre foi admitida, primeiro, só pela doutrina (por todos, Marcelo Caetano, "Manual", 9.ª edição, II, 1264) e depois pela própria lei (art.º 34 da LPTA e art.º 161 do CPA) como princípio geral, ela seria necessária sempre que uma lei avulsa previsse uma reclamação, ainda que não dissesse expressamente que se tratava de uma reclamação necessária, pois não faria qualquer sentido estar a prever algo que já era permitido. É justamente isso que se vê no sumário do acórdão STA de 2.12.99, proferido no recurso 45243 (o que, de resto, se pode ver em muitos outros, designadamente nos acórdãos de 17.1.01 e de 19.12.06, respectivamente, nos recursos 40567 e 825/06 da Secção e de 25.5.05, proferido no recurso 1652/02, do Pleno), "Quando a lei prevê em termos expressos uma reclamação graciosa, inserida em determinado trâmite a seguir no respectivo processo, impõe-se considerá-la, na falta de outra explicação adequada resultante da lei, como reclamação necessária, constituindo pressuposto do uso de ulterior meio de impugnação contenciosa". Portanto, equiparou-se essas situações àquelas em que o próprio legislador disse ser a reclamação necessária. Destarte, haverá de concluir-se que são necessárias as reclamações especialmente previstas em diplomas anteriores à entrada em vigor do CPTA que já eram assim consideradas. (bold nosso).(…)Pode, pois, assentar-se num conjunto de regras determinadas pela entrada em vigor do CPTA. Assim, apenas são admissíveis impugnações administrativas necessárias, após a vigência do CPTA, quando a lei o disser expressamente. Quanto às anteriores, só devem considerar-se necessárias aquelas cuja existência estivesse prevista na lei e fossem tidas (pela jurisprudência), por isso, como necessárias.».Assim, atentos os fundamentos exarados nos Acórdãos citados, os quais acompanhamos, que no caso em apreço e face ao disposto nos art. 120º do RD GNR, que a presente impugnação contenciosa tivesse de ser precedida de recurso hierárquico necessário para o Sr. Ministro da Administração Interna, sendo por isso condição necessária à procedência da presente acção especial.Ora, não tendo o A. interposto tal recurso hierárquico necessário no prazo consignado no mesmo art. 120º, é um facto que o acto em crise é inimpugnável contenciosamente, pelo que ao dessa forma ter decidido, a sentença em recurso não nos merece censura, não enfermando dos vícios que lhe são imputados pelo recorrente.IV – Pelo que, em face do exposto e em conclusão, emito parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso mantendo - se a sentença recorrida.

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