terça-feira, 9 de novembro de 2010

Data:
19-05-2009
Processo:
05104/09
Nº Processo/TAF:
00085/09.4BELRA
Sub-Secção:
2º. Juízo
Magistrado:
Maria Antónia Soares
Descritores:
CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL.ACTO DE EXCLUSÃO DE CONCORRENTE.RECURSO HIERÁRQUICO FACULTATIVO.IRREGULARIDADE NA NOTIFICAÇÃO DO ACTO IMPUGNABILIDADE CONTENCIOSA.ART. 59º Nº 5 DO CPTA.
Data do Acordão:
25-06-2009

Texto Integral:
A magistrada do Ministério Público junto deste TCAS, tendo sido notificada, nos termos do nº1 do artº 146º do CPTA, para emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, vem sobre o mesmo referir o seguinte:No saneador/sentença aqui recorrido, decidiu-se considerar procedente a excepção dilatória da inimpugnabilidade da deliberação de 20-11-08, da Comissão de Abertura das Propostas que, após reclamação da Autora, manteve a sua exclusão do concurso público, aberto pelo Município de Ourém, para concepção/construção do Centro Escolar de Ourém, com fundamento em que dessa deliberação cabia recurso hierárquico necessário, nos termos do nº1 do artº 99º do DL nº 59/99, de 3-3.Por não concordar com esta sentença a Autora, nas suas alegações de recurso jurisdicional, defende que o recurso hierárquico não é obrigatório e que existe omissão de pronúncia por a sentença não ter conhecido da questão da irregularidade de notificação do acto impugnado por nessa notificação não ter sido indicado qual o órgão competente para apreciar a impugnação do acto e qual o prazo para o efeito, no caso de o acto não ser susceptível de recurso contencioso, nos termos do artº 68º do CPA.Adiante-se desde já que não se verifica a alegada omissão de pronúncia.E isto porque a impugnabilidade ou inimpugnabilidade da decisão da reclamação para o Tribunal Administrativo não depende da regularidade ou irregularidade da respectiva notificação.De facto, o incumprimento das orientações estabelecidas no artº 68º do CPA, para as notificações de actos administrativos, nenhuma influência tem na apreciação da respectiva legalidade. Apenas poderá ocasionar que tal notificação não possa relevar para efeitos de contagem de prazo da impugnação graciosa ou contenciosa.Por outro lado e no que respeita ao requisito da notificação a que alude a alínea c) do nº1 do artº 68º do CPA- a indicação do órgão competente para apreciar a impugnação do prazo para este efeito, no caso de o acto não ser susceptível de recurso contencioso – não dá ao interessado a faculdade de concluir pela recorribilidade contenciosa do acto (cfr, neste sentido, o acórdão do STA de 7-3-96, in recº 39216).Assim, por esta questão nenhuma influência poder ter na decidida inimpugnabilidade contenciosa da decisão da reclamação em análise, parece-nos que não teria que ser conhecida.Já quanto à decidida inimpugnabilidade da decisão da reclamação, nos parece que merece censura a sentença recorrida.De facto, tal como refere Mário Aroso de Almeida in Cadernos de Justiça Administrativa nº34, págs 69 a 79 - de resto citado na douta sentença recorrida - uma decisão administrativa só estará sujeita a recurso hierárquico necessário nos estritos casos em que isso esteja expressamente previsto na lei.No mesmo sentido e tendo em vista o disposto no nº1 do artº51º e no nº5 do artº59º, todos do CPTA, .se pronunciaram Mário Aroso de Almeida e Carlos A. Cadilha, in “ Comentários ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, a pgs. 262/264 e Vasco Pereira da Silva, in “ De necessário a útil: a metamorfose do recurso hierárquico”, a pág. 26/30.Ora, tal não é, de todo, o caso vertido nestes autos.De facto, reza o nº1 do artº 99º do DL nº 59/99 que” das deliberações sobre reclamações, apresentadas nos termos dos artºs 49º, 88º e 98º, cabe directamente recurso para a entidade competente”, não definindo, assim, clara e inequivocamente, o legislador, se tal recurso é ou não hierárquico ou se é ou não necessário.Assim, tem aqui, a nosso ver, plena aplicação, o nº1 do artº 51º do CPTA, que altera toda a filosofia acerca da recorribilidade contenciosa dos actos com definitividade vertical, passando a impugnabilidade desses actos a fazer-se em função apenas da sua eficácia externa, considerando que “ …são impugnáveis os actos administrativos com eficácia externa, especialmente aqueles cujo conteúdo seja susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos”( cfr neste sentido, os nºs 4 e 5 do artº 268º da CRP).De resto, sempre teria aqui aplicação o nº2 do artº66º do CPTA, por força do nº4 do artº 51º por sua vez aplicável por força do nº1 do artº 100º, nos termos do qual, o objecto do processo é a pretensão do interessado e não o acto de indeferimento.Para a tese da legitimação da presente acção concorrem igualmente os nºs 4 e 5 do artº 59º do CPTA, os quais são aplicáveis ao contencioso pré-contratual como foi decidido em acórdão do STA relativamente recente ( cfr ac do STA de 17-12-08, p 841/08-12Referem, estes dispositivos legais, o seguinte:4. A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo legal.5. A suspensão do prazo previsto no número anterior não impede o interessado de proceder à impugnação contenciosa do acto na pendência da impugnação administrativa, bem como de requerer a adopção de providências cautelares.Segundo o douto acórdão do STA de 18-12-06, in procº nº 01061/06, “é verdade que quem sustentava a inconstitucionalidade das normas que previam impugnações administrativas necessárias já antes do CPTA, continua hoje a fazê-lo após o CPTA, defendendo que a impugnação dita necessária é hoje um condicionamento desnecessário, porque afinal, face aos citados preceitos do CPTA, a impugnação administrativa tem sempre carácter facultativo e suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto, sem prejuízo do administrado poder impugnar contenciosamente o acto na pendência da impugnação administrativa ou decorrido o prazo legal para a sua decisão, o que significa que a impugnação necessária perdeu qualquer utilidade, já que a sua única razão de ser era permitir o recurso contencioso (Cf. Vasco Pereira da Silva, De necessário a útil…, CJA nº47, p.21 e segs., maxime p. 23 e 25)”.Ora, muito embora o douto acórdão citado tenha concluído pela necessidade de recurso hierárquico necessário nos casos expressamente previstos na lei, parece-nos que, no caso vertente, para além deste tipo de recurso gracioso não estar claramente previsto, como já referimos, entendemos que em face do nº5 do artº 268º da CRP, bem como das disposições conjugadas dos nºs 4 e 5 do artº59º do CPTA, que pretenderam, sem dúvida, alterar alguma coisa na ordem jurídica em relação à obrigatoriedade da impugnação administrativa como meio da abertura da via contenciosa.Tendo em vista especialmente o nº5 do artº 59º do CPTA, verifica-se que este normativo, referindo-se a “impugnação administrativa”, não distingue entre reclamações e recursos ou entre impugnações necessárias e facultativas, pelo que deverá, a nosso ver, abranger também os recursos hierárquicos necessários.Assim, interposto recurso hierárquico necessário de um acto, nada impede que se impugne o mesmo contenciosamente na pendência desse recurso, pelo que, também no caso dessa não interposição graciosa, terá que se entender que é possível impugnar o acto contenciosamente, como aconteceu no caso vertente.Parece ser esta, na verdade, a solução que mais se coaduna com a letra da lei e também com o seu espírito na medida em que o princípio pro actione, bem como o princípio da prevalência da substância sobre a forma, nortearam, sem dúvida, a elaboração do CPTA, o qual, neste aspecto, parece ter derrogado muitas das normas do CPA sobre o recurso hierárquico necessário, passando este, assim, em todos os casos, a ser facultativo.Nestes termos e tendo em vista o exposto, concluiria pela procedência do presente recurso jurisdicional com a consequente revogação do saneador/sentença e prosseguimento da acção com vista à apreciação da questão de fundo.

Sem comentários:

Enviar um comentário