sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Numa concepção clássica, à luz do modelo francês, o Contencioso Administrativo era de tipo objectivo, o processo consistia na mera verificação da legalidade do acto administrativo. Particular e Administração não eram partes no processo, assumiam a posição de colaboradores do tribunal na defesa da legalidade e interesse público.

Essa concepção foi afastada pela Constituição de 1976, com a jurisdicionalização do Contencioso Administrativo, Particular e Administração passaram a ser parte no processo. A reforma de 1984/1985 intensificou a tónica subjectivista no contencioso Administrativo.

O juiz passa a ser um terceiro, perante o qual Particular e Administração defendem as suas posições sob a luz dos princípios da igualdade e da legalidade, constitucionalmente preconizados.
Estava enfim criada a ideia de processo administrativo de partes.

Actualmente a “ Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos” cfr. Artigo 266º/ n.º 1 da CRP.
O princípio da legalidade impõe um limite à acção da Administração Pública, que na sua actuação, tem que respeitar os direitos subjectivos e os direitos legítimos dos particulares.
Diz o princípio da Igualdade e Proporcionalidade que “As decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afectar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objectivos a realizar”

Embora o princípio da legalidade continue a desempenhar a função de proteger os direitos e interesses dos particulares, é certo que mesmo o escrupuloso cumprimento da lei por parte da Administração Pública não pode garantir o respeito integral dos direitos subjectivos e dos direitos legítimos dos particulares.

Mesmo a “administração de prestação” pode levar a violações de direitos ou interesses legítimos de particulares, isto porque a administração constitutiva ou administração de prestação nem sempre pode beneficiar todos os particulares, ou beneficiá-los todos por igual.

A ideia de administração de prestação, ao serviço do desenvolvimento económico e da justiça social, não é dissociável da ideia de sacrifício de direitos ou interesses legítimos dos particulares.

Mas note-se, quem sofre ilegalmente um prejuízo tem possibilidade de afastar esse prejuízo ilegal, assim o titular do interesse tem uma nova oportunidade de ver satisfeito o seu direito.
Trata-se, portanto, de uma situação de vantagem em que os particulares se encontram perante a Administração, mas obviamente inferior, em termos de vantagem, àquela que ocorre no caso do Direito Subjectivo.

Há interesse legítimo, porque a obrigação de respeitar a legalidade que recai sobre a Administração pode ser invocada pelos particulares a seu favor, para remover as ilegalidades que os prejudiquem e para tentar em nova oportunidade a satisfação do seu interesse, na certeza de que, ao tentá-lo, na pior das hipóteses, se esse interesse acabar por ser insatisfeito ou prejudicado, essa insatisfação ou esse prejuízo terão sido impostos legalmente.

Há interesses Subjectivos, interesses próprios dos particulares, porque esses interesses são protegidos directamente pela lei como interesses individuais, e porque, consequentemente, a lei dá aos respectivos titulares o poder de exigir da Administração o comportamento que lhes é devido, e impõe à Administração a obrigação jurídica de efectuar esse comportamento a favor dos particulares em causa, o que significa que se esses comportamentos não forem efectuados, os particulares dispõem dos meios jurídicos, designadamente dos meios jurisdicionais, necessários à efectiva realização dos seus direitos.

Tanto na figura do Direito Subjectivo como na do interesse público legítimo, existe sempre um interesse privado reconhecido e protegido pela lei. Mas a diferença está em que no Direito Subjectivo essa protecção é directa e imediata, de tal modo que o particular tem a faculdade de exigir à Administração Pública um comportamento que satisfaça plenamente o seu interesse privado. Ao passo que no interesse legítimo, porque a protecção legal é meramente indirecta ou reflexa, o particular tem apenas a faculdade de exigir à Administração um comportamento que respeita a legalidade.

Em suma no Direito Subjectivo, o que existe verdadeiramente é um interesse directo, pessoal e legítimo. No interesse legítimo, o que existe é apenas um direito à legalidade das decisões que versem sobre um interesse próprio.

O interesse diz-se “directo” quando o benefício resultante da anulação do acto recorrido tiver repercussão imediata no interessado. Ficam, portanto, excluídos da legitimidade processual aqueles que da anulação do acto recorrido viessem a retirar apenas um benefício mediato, eventual, ou meramente possível.
O interesse diz-se “pessoal” quando a repercussão da anulação do acto recorrido se projectar na própria esfera jurídica do interessado.
O interesse diz-se “legítimo” quando é protegido pela ordem jurídica como interesse do recorrente.

Pelo supra explanado, importa referir o que se entende por Interesse processual, que se traduz no facto de o direito do demandante estar sujeito a tutela judicial, exigindo-se a verificação objectiva de um interesse real e actual, isto é, da utilidade na procedência do pedido.
Já a Legitimidade das partes consiste fundamentalmente em serem as partes os sujeitos da relação material controvertida, ou seja, do direito e da correlativa obrigação. Sendo o demandante o titular do direito e o demandado o sujeito da obrigação. Tal pressuposto é analisado com base nos termos da petição inicial apresentada pelo demandante, ou seja, a sua apreciação não aguarda o conhecimento da questão de fundo traduzindo-se antes num controlo formal.

O art.º 9 do CPTA, sob epigrafe “Legitimidade Activa”, determina que a legitimidade decorre da alegação da posição da parte na relação material controvertida. É a tutela de posições subjectivas, o reconhecimento de uma posição de vantagem particularmente ampla do particular.

O professor Vasco Pereira defende que todas as posições substantivas de vantagem dos privados perante a Administração devem ser entendidas como direitos subjectivos, afastando-se da distinção tradicional tripartida que separa direitos de 1.ª, 2.ª e 3.ª categoria, entenda-se direitos subjectivos, interesses legítimos, e por último interesses difusos.

Nesse sentido o direito subjectivo que o particular alega no processo, como parte da relação material controvertida, tem um carácter pessoal e legítimo. Note-se que o interesse é pessoal por se “encontrar“ na própria esfera jurídica do particular; é legítimo porque esse direito lhe foi conferido por uma norma atributiva de um direito, ou por uma imposição de um dever à Administração.
O art.º 55º do C.P.T.A, vai ao encontro do supra narrado.

A posição do professor Vasco Pereira proclama uma legitimidade processual mais restrita, são titulares de posições subjectivam aqueles que são partes na relação material controvertida.

Já o professor Vieira de Andrade defende uma concepção mais ampla de legitimidade activa processual, refere que o interesse dos particulares pode ser decorrente de um direito subjectivo, num interesse legalmente protegido ou numa potencial vantagem aquando da procedência da acção.

Independentemente da teoria adoptada parece existir um alcance prático na distinção entre Direito Subjectivo e Interesse Legítimo.
Pode-se indicar cinco categorias de efeitos para os quais é relevante, no Direito português, a distinção entre Direito Subjectivo e interesse legítimo, são eles:
a) Retroactividade das leis: a Constituição, no seu art.º 18º/3, proíbe a retroactividade da lei se se tratar de leis restritivas de Direitos, Liberdades e Garantias dos cidadãos, mas não se proíbe a retroactividade da lei se se tratar de leis restritivas de interesses legítimos. Por conseguinte, é importante saber que uma lei retroactiva que pretenda ser restritiva de direitos subjectivos é inconstitucional, mas se for restritiva de interesses legítimos a sua retroactividade não é inconstitucional.
b)Política administrativa: a actividade policial é uma actividade de natureza administrativa, é um dos ramos da administração pública. Resulta do art.º 272º CRP que as actividades de natureza policial estão limitadas pelos direitos dos cidadãos, mas não pelos seus interesses legítimos.
c) De acordo com os princípios gerais do Direito Administrativo, é em princípio proibida a revogação de actos administrativos constitutivos de direitos: a lei em relação aos actos constitutivos de direitos, diz que salvo se forem ilegais esses actos não podem ser revogados. Diferentemente, os actos constitutivos de interesses legítimos em princípio são revogáveis.
d)Execução das sentenças dos Tribunais Administrativos: se uma sentença anula um acto administrativo ilegal, resulta para a administração o dever de executar essa sentença reintegrando a ordem jurídica violada.





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