sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

A repartição das competências entre os tribunais administrativos

Com a reforma de 2002, a repartição das competências entre os tribunais administrativos, tornou-se mais facilitada visto que os tribunais administrativos de círculo passaram a ter uma competência genérica como tribunal de primeira instância, funcionando o Supremo Tribunal Administrativo e os Tribunais Centrais Administrativos só em raros casos como tribunais primários.

- Repartição da competência em razão da matéria:
  • Supremo Tribunal Administrativo- Estão reservados ao STA em primeiro grau de jurisdição, nos termos do artigo 24º, nº1 do ETAF:
  1. Os processos em matéria administrativa relativos a acções ou omissões do Conselho de Ministros e do Primeiro Ministro e ainda de todos os órgãos supremos do Estado (Presidente da República, Assembleia da República e seu Presidente, Tribunal Constitucional e seu Presidente, Presidente do STA, Tribunal de Contas e seu Presidente) e de determinados órgãos constitucionais (Conselho Superior de Defesa Nacional, Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e seu Presidente, Procurador-Geral da República e Conselho Superior do Ministério Público), bem como dos pedidos cumulados com esses processos (alíneas a) e e));
  2. Os processos relativos a eleições previstas no ETAF (alínea b));
  3. Os pedidos de providências cautelares relativos aos processos da sua competência, bem como os pedidos de execução das suas decisões (alíneas c) e d));
  4. As acções de regresso por responsabilidade funcional propostas contra juízes do STA e do TCA e magistrados do Ministério Público em exercício de funções junto desses tribunais (alínea f));
  5. A emissão de pronúncias vinculativas sobre o sentido em que devem ser resolvidas, por tribunais administrativos de círculo, questões de direito novas, que suscitem dificuldades sérias e se possam vir a colocar noutros litígios, no seguimento de reenvio prejudicial determinado pelo presidente de um Tribunal Administrativo de Círculo (artigo 25º, nº2 ETAF);
  • Tribunais Centrais Administrativos- No que respeita ao primeiro grau de jurisdição, conhecem apenas das acções de regresso por responsabilidade funcional propostas contra juízes dos tribunais administrativos de círculo e tribunais tributários e magistrados do MP em exercício de funções junto desses tribunais (artigo 37º, c) do ETAF).

  • Tribunal Administrativos de Círculo - Compete-lhes conhecer, em primeira instância, de todos os processos do âmbito da jurisdição administrativa, com excepção daqueles cuja competência esteja reservada aos tribunais superiores;

  • Tribunais Arbitrais- Com a reforma de 2002, houve uma ampliação material de jurisdição arbitral. De acordo com o artigo 180º do CPTA, as questões a submeter a arbitragem já não respeitam apenas a questões de contratos ou de responsabilidade civil extracontratual. Agora, os contratos já não têm de ser apenas administrativos, mas quaisquer contratos onde se apliquem regras de direito público administrativo e incluem a apreciação de actos administrativos relativos à respectiva execução (nº1 a)). No que toca a responsabilidade civil extracontratual, actualmente os danos podem tanto decorrer de actos de gestão pública como de actos de gestão privada da administração (nº1 b)).
    Uma novidade da reforma consiste no facto de, a arbitragem se estender a questões relativas a actos administrativos que possam ser revogadas sem fundamento na sua ilegalidade nos termos da lei substantiva (nº1 c), ou seja, a arbitragem abrange todos os actos cujos efeitos não sejam impostos por lei imperativa.


- Repartição da competência em razão da hierarquia:


Mesmo existindo a limitação em função do valor de processo, está presente um duplo grau de jurisdição segundo o qual há lugar à apreciação das sentenças proferidas pelo tribunal de primeira instância por um tribunal superior, ou mesmo dentro do próprio Supremo Tribunal Administrativo, a uma formação de julgamento alargada relativamente ao que se decidiu em primeira instância. Deste modo, os recursos das decisões dos Tribunais Administrativos de Círculo são conhecidos pela Secção do Contencioso Administrativo dos Tribunais Centrais Administrativos, excepto em casos em que haja recurso per saltum para a Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal de Justiça (artigo 37º, a) do ETAF). Estes casos de recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça são os previstos no artigo 151º do CPTA e no artigo 24º, nº2 do ETAF, onde há recurso de revista apenas sobre questões de direito, relativo a decisões de mérito, em processos de valor elevado ou indeterminável, com ressalva de algumas matérias. Quanto aos recursos dos acórdãos dos Tribunais Centrais Administrativos, são colocados na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo segundo o artigo 24º, nº1 g) e nº2 do ETAF. Relativamente aos recursos dos acórdãos proferidos em 1º grau de jurisdição pela Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo são conhecidos pelo Pleno da Secção, nos termos do artigo 25º, nº1 a) do ETAF. No que respeita aos recursos das decisões dos tribunais arbitrais, estes devem ser interpostos para os Tribunais Centrais Administrativos, em paralelo com a jurisdição civil. É ainda importante referir que é da competência do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo resolver os recursos para uniformização de jurisprudência, quando exista contradição entre dois acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo ou dois acórdãos dos Tribunais Centrais Administrativos ou um do Supremo Tribunal Administrativo e outro do Tribunal Central Administrativo.

- Repartição da competência em razão do território:

Esta questão tem maior relevância para os Tribunais Administrativos de Círculo, e pressupõe a determinação do âmbito de sede e das respectivas áreas de jurisdição por uma lei especial, de acordo com o artigo 39º, nº1 do ETAF. A distribuição de competência é realizada de acordo com o critério segundo o qual é competente o tribunal da residência habitual do autor ou da maioria dos autores do processo (artigo 16º CPTA), com o intuito de favorecer os particulares a quem cabe a iniciativa processual. Todavia há algumas excepções a este critério em função do tipo de processo, da matéria ou do objecto da acção, como se pode verificar pelos artigos 17º, 18º, 19º e 20º do CPTA.


-Conflitos de competência na ordem judicial administrativa


A lei, no artigo 24º nº1 h) do ETAF, atribui à Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo a resolução de todos os conflitos de competência entre tribunais administrativos. Aplica-se a estes processos o disposto no artigo 115º e seguintes do Código Processo Civil, com as particularidades previstas no artigo 135º e seguintes do CPTA. É de destacar que de acordo com o artigo 139º do CPTA, a decisão que resolva o conflito, para além de especificar qual o tribunal competente, determina a invalidade da decisão do tribunal incompetente


Concluímos que, com a reforma geral da organização dos tribunais administrativos, tentou-se evitar o congestionamento dos tribunais superiores com processos menores, mas assegurando que as questões de relevo jurídico ou social possam ser conhecidas pelo Supremo Tribunal, a quem compete cuidar da boa aplicação do direito administrativo e pela uniformização da jurisprudência. Quanto aos tribunais arbitrais, o alargamento do âmbito de arbitragem significou uma mudança qualitativa, abandonando-se o critério de exclusividade do contencioso para os tribunais permanentes.


Cláudia Magalhães
Nº 16965

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